Em Destaque

SAUDAÇÃO À PROFESSORA DOUTORA LUCÍLIA NUNES

11/10/18

A Saúde dos Cidadãos e os Territórios Profissionais

Vem isto a propósito das várias formas, mais ou menos camufladas, de se continuar numa lógica de organização de cuidados e de respostas às necessidades dos cidadãos mais centradas nas organizações e nas profissões do que no que deveria ser o um fluxo onde cada profissional responde pela sua competência e com autonomia num quadro de complementariedade e num modelo de colaboração onde o centro tem de ser as necessidades daqueles que nos confiam os seus cuidados.

a razão desta escrita foi isto …alterei apra o que escrevi acima
 notícia sobre  a decisão do Bastonário da Ordem dos Médicos, Dr Miguel Guimarães, de abandonar o Conselho Nacional de Saúde, justificada pela não substituição do seu Presidente, Doutor Jorge Simões ao qual é atribuido afirmações que se reportam a Setembro último sobre a possibilidade de enfermeiros realizarem actos próprios dos médicos.

Vejamos:

Quando alguém se pensa possuidor de um território e se sente ameaçado mesmo que seja
apenas por percepção monta as barreiras que entende necessárias para o defender. Na saúde, assumem os territórios das profissões, a sua ocupação e a sua interdependência uma inevitável tensão que só a procura das soluções mais adequadas para as respostas às necessidades dos cidadãos em cuidados de saúde pode esbater. 

Pensar saúde é pensar mais do que tratar e curar doenças. Pensar saúde é pensar mais que
números e atos isolados. Pensar saúde é mais do que pensar despesas e receitas. Pensar saúde
é mais do que pensar cada profissão por si.
Pensar saúde é pensar e agir de acordo com as necessidades dos cidadãos procurando o
necessário equílibrio entre as necessidades sentidas/ as necessidades identificadas e as
respostas ajustadas que o conhecimento científico suporta e que se podem disponibilizar.

Pois bem, é neste “poder disponibilizar” que, apesar da interferência das políticas gestionárias
implementadas e dos recursos financeiros existentes que as suportam,  se cruzam os territórios de intervenção das profissões de saúde na organização dos cuidados que podem ser disponibilizados.

Sendo a questão transversal a todas as profissãos de saúde determe-ei no que a médicos e enfermeiros diz respeito.

Ora se analisarmos um pouco, e com serenidade, facilmente compreenderemos que os
territórios de intervenção dos vários profissionais não podem ser transferidos entre eles. Ou
seja:
- o médico aplica o seu saber suportado na evolução da medicina, procurando sempre as
melhores soluções para a pessoa quando portadora de uma doença que passam pelo   tratamento e a cura ou/e sempre que possível que a mesma seja evitada. Por isso, quando estamos doentes todos
confiamos que o médico nos trate com todos os meios que possam conduzir à cura ou à
minimização dos efeitos da doença quando ela não tem cura, mas também promovendo as
intervenções dirigidas à pessoa, família ou comunidade que possam evitar a doença evitável.

- o enfermeiro aplica o seu saber suportado na evolução da enfermagem, procurando sempre
promover as melhores condições para a que a pessoa portadora de doença maximize todas as
suas potencialidades para poder melhor reagir à sua situação e/ou aplicando todos os
instrumentos disponíveis que possam minimizar os deficites daí decorrentes e também
promovendo as intervenções dirigidas à pessoa, família ou comunidade que possam evitar a
doença evitável.

Assim, é neste quadro  de referência e na relação com todas as outras profissões que
médicos e enfermeiros actuam em complementaridade e têm a responsabilidade de garantir
aos cidadãos as respostas mais eficazes às suas necessidades em saúde.

É isto que deve ser discutido e aprofundado e aí ser encontrada a forma e legitimação do que
cada um pode e deve fazer em função dos seus saberes próprios, da partilha das soluções
possíveis e do reconhecimento mútuo das competências de cada um. Ao desenvolvê-las em conjunto acresce valor no processo de cuidados e elimina barreiras que são desperdício de recursos.

Na distribuição de médicos e enfermeiros, Portugal tem um padrão que que se afasta da média europeia e que dificulta objectivamente a alteração do paradigma da saúde condicionado pela lógica da doença.

Entre os 28 países da EU o nº de médicos por 1000 habitantes era de 4,4 correspondendo ao 3º lugar, sendo a média europeia de 3,5 (13º lugar). O inverso se verifica com os enfermeiros com 6,1 enfermeiros por 1000 habitantes, ocupando o 20º lugar e sendo a média europeia 8,4 (11º lugar), estes dados significam que Portugal tem uma proporção de enfermeiros/médicos de 1,4 quando a média da EU é de 2,4.

Ora se pensarmos que a evolução positiva da esperança de vida transporta consigo
necessidades de cuidados de saúde de proximidade, de apoio e manutenção das capacidades
para  se atingir o máximo de autonomia,  percebemos que o suporte ao auto-cuidado assume e deverá assumir um peso muito mais relevante do que hoje se verifica,  e que para tal, são necessários mais enfermeiros do que aqueles que hoje são contratados no quadro dos serviços de saúde.

O aumento da esperança de vida em Portugal acompanhou os avanços dos restantes países da
EU e num tempo mais rápido. Este facto não é alheio à melhoria das respostas em saúde e das
condições de vida em geral que o pós 25 de Abril permitiu. Mas estamos ainda longe de que o
ganho em anos de vida seja acompanhado de anos de vida saudável. Se compararmos, por
exemplo, uma mulher após os 65 anos  na Suécia tem 3 vezes mais anos de vida saudáveis do que uma mulher portuguesa.

As pessoas portadoras de várias doenças crónicas são as que em regra recorrem mais às
urgências hospitalares ficando aí, por vezes, em condições que nem sempre ajudam a resolver o
problema, pela superlotação que aí se encontra. Ora se a estas pessoas forem disponibilizados
cuidados, permanentes e atempados,  que permitam diminuir situações de agudização que evitem o recurso à urgência e ao internamento hospitalar,  estaremos a humanizar os cuidados e simultaneamente a utilizar melhor os recursos disponíveis. Para tal é necessário um profissional que seja o gestor com a disponibilidade necessária para o suporte ao processo e encaminhamento se necessário. Não pode o enfermeiro ser quem assegura esta gestão? Nada o impede senão uma visão retrógrada e burocrática que impede agilizar processos e referenciações de acordo com as necessidades em cuidados.

É esta visão burocrática que nada tem a ver com substituição de tarefas que impede por exemplo que o enfermeiro, que acompanha  um doente com colostomia, no domicilio ou na consulta de enfermagem do Centro de Saúde, que ao avliar o estado da pele e do estoma decide ser necessário alterar o tipo de saco que melhor se adapta, decide e indica qual deve ser adquirido, ou seja prescreve. Mas para que a sua compra seja comprticipada é obrigatório apresentar uma receita médica…

Estas práticas não fazem sentido nem sob o ponto de vista técnico – porque desresponsabiliza
quem toma a decisão - nem sob o ponto de vista económico pelo tempo desperdiçado tanto
pelos utentes como pelos profissionais.

Nestes exemplos e em muitas das situações do quotidiano vividas por médicos, enfermeiros e
outros profissionais, é difícil aceitar que, apesar de ser reconhecido que o enfermeiro avalia a situação e decide a intervenção necessária, incluindo nela os procedimentos técnicos baseados na melhor prática, que ainda garante a continuidade de cuidados e identifica eventuais alterações, seja exigida ainda uma opinião/intervenção de outro profissional, nomeadamente do médico.

Sendo esta a realidade, porque continua a ser díficil conceber novos modelos de organização e prestação de cuidados que incorporem uma lógica de responsabilização pela complementaridade e não pela subordinação?

Se com realismo e frontalidade olharmos esta realidade, percebemos que (i) a evolução
tecnica e científica das várias profissões (ii) as respostas às necessidades em cuidados que os
cidadãos têm direito a usufruir (iii) a evidência de que o modelo biomédico tradicional não
responde às exigências de mais e melhor saúde, obriga a que se alicerce de uma nova filosofia
que suporte uma nova organização do processo de cuidados. Não o fazer é desperdiçar
recursos e alimentar lógicas de poderes instituídos que, centrados em si próprios, conduzem  à
negação da natureza das profissões de saúde,  e em consequência, à efectiva melhoria das
organizações de saúde onde os cidadãos esperam ter ao seu dispor os profissionais que
melhor possam responder às suas necessidades percecionadas.

Por isso afirmamos as profissões de saúde existem porque as pessoas têm direito a usufruir
dos cuidados a que o estado da arte obriga cada profissional a disponibilizar na resposta às
efetivas necessidades percecionadas e identificadas. Cada profissional tem a obrigação
de reconhecer os limites da sua intervenção sabendo e atuando de acordo com as suas
competências, mas sempre num quadro de complementariedade interprofissional e
interdisciplinar.

Nenhuma profissão será diminuída. Pelo contrário só num modelo de corresponsabilização e
não de subordinação se dispensarão o conjunto dos cuidados de saúde que contribuam para
mais saúde e bem-estar dos cidadãos. Reconhecer isto é um imperativo ético e deontológico a
que as profissões de saúde estão obrigadas.

Por tudo isto não é compreensível o abandono do Conselho Nacional de Saúde por quem tem o dever de participar em tudo o que à saude diz respeito.

Maria Augusta Sousa

Em agenda :


18/07/18

João Semedo, obrigada pelo que nos ensinou - a sua luta até nos deixar não será em vão


Obrigado pela  persistência na defesa do que sempre acreditou – o bem público como único objectivo de fazer política impregnando na sua relação o trato do respeito pelo outro.
Por isso, mantendo sempre a coerência nas suas convicções e na sua prática, nos ensinou que não abdicando delas há sempre pontes que se podem fazer mesmo com outros que não pensam como nós desde que estejam em causa as pessoas e a melhoria das suas condições de vida.
Somos enfermeiros, defensores do SNS, por isso aqui fica o nosso obrigado e o nosso compromisso como tributo à defesa que até ao fim manteve para salvar a maior conquista do Portugal democrático – o direito à saude garantido pelo nosso SNS.

12/07/18

CONTRIBUTOS PARA A REVISÃO DA LEI DE BASES DA SAÚDE


Enfermeiro Pedro Aguiar - Cidadania na Enfermagem
No atual contexto demográfico, social e económico do país é necessária uma mudança de paradigma na abordagem da saúde, deixando de ver a saúde como médico e medicamento e encontrando novas estratégias que se articulem com políticas e mobilizem a ideia de que o bem-estar do cidadão está diretamente ligado à prosperidade económica.
Hoje a população é mais idosa. Observa-se na população portuguesa uma baixa taxa de natalidade e fecundidade e um aumento da esperança média de vida.
A população acumula-se no litoral aumentando a população urbana e principalmente a periurbana intensificando a iniquidade entre litoral e interior e entre região urbana e periurbana.
A desregulação no acesso à saúde conduziu a que existam portugueses com acesso a médico e enfermeiro de família e outros não, o que entre outras consequências, faz com que cerca de 40% das urgências hospitalares sejam problemas de cuidados saúde primários.
Observam-se problemas na verdadeira implementação de reformas conducentes do plano nacional de saúde. A implementação da Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI) não dá resposta a todas as necessidades, é difícil o acompanhamento da doença crónica e o acesso a cuidados paliativos, não há monitorização da adesão ao regime terapêutico, a saúde escolar tem grandes lacunas e a saúde mental contínua no paradigma da institucionalização e com pouca intervenção comunitária.
No mercado da saúde há uma relação de agência imperfeita devido à assimetria de informação entre os consumidores e prestadores. Deste modo, o cidadão fica numa situação de fragilidade quando necessita de cuidados.
A liberalização do acesso e a indução da procura elevam o risco moral levando a que os serviços públicos ou com acordos, mais tarde ou mais cedo, ficarão lotados, multiplicando o número de consultas, meios complementares e de diagnóstico, consumo de medicamentos e número de urgências e internamentos. Neste contexto, exige-se, ao estado, que assuma um real controlo deste aumento do consumo e consequente aumento de custos.
A reforma da Lei de Bases da Saúde cria um momento propício para esta reflexão, discussão e implementação.
O que queremos do SNS? O que queremos da reforma que se pede à Lei de Bases da Saúde?
Queremos apenas um make-up legislativo que favoreça apenas alguns? Ou queremos aproveitar a saúde para uma verdadeira reforma organizativa em torno do cidadão?
Olhando para o sistema de saúde existente, o maior consumo está nas estruturas hospitalares e na indústria que gravita em torno destes. O aumento dos players privados na saúde e o baixo investimento na saúde publica dos últimos anos leva a um crescimento das desigualdades no acesso à saúde, pelo que se torna imperativo que o estado assuma um papel regulador efetivo e impeça estas desigualdades.
Será necessário que se pense no modelo de decisão. Queremos um SNS burocraticamente pesado, em que uma decisão de cuidado ao cidadão, tenha de passar por Ministério das Finanças, Ministério da Saúde, ACSS, ARS’s, Hospital/ACES e Profissional de Saúde?
Desta forma, tornam-se evidente que de uma vez por todas se pense num SNS que olhe para o cidadão como o principal player, levantando assim várias necessidades.
A melhoria e reforço dos cuidados primários. Deverá ser reforçada a aproximação ao cidadão transferindo recursos dos hospitais para os cuidados de saúde primários, garantindo um acesso facilitado e um melhor acompanhamento do cidadão. A aposta na educação para a saúde e hábitos de vida saudáveis desde a idade escolar deverá ser também uma das prioridades.
A diminuição da permanência em meio hospitalar através do reforço da RNCCI. Deverão ser desenvolvidas ações de promoção de envelhecimento ativo, promoção da autonomia e promoção de descentralização e intervenção em proximidade com e na comunidade. O idoso deverá, cada vez mais, permanecer no seu ambiente familiar ao invés da institucionalização.
Tudo isto exige ainda uma verdadeira integração dos cuidados que promova a articulação aos diferentes níveis (primário, secundário e continuados) colocando o cidadão no centro do sistema. As Unidades Locais de Saúde são uma forma de executar esta integração, mas será necessária uma avaliação dos casos de implementação existentes, de modo a perceber se será o melhor ou se também aqui teremos de alterar a forma de realizar. Nesta ideia de integração e evolução é necessário ter em atenção o serviço social que deverá estar mais perto que longe da saúde. E para isto, torna-se imperativa a criação de um gestor de cuidados tendo em conta o problema major do cidadão, saúde (doença crónica, saúde familiar) ou social (habitação, isolamento social).
Com a transferência de cuidados para os CSP e RNCCI o hospital deverá ficar restrito a cuidados complexos, garantindo nesta casuística uma prestação de qualidade. A concentração dos hospitais em centros hospitalares deveria ter iniciado esta convergência de cuidados com a agregação de atividades similares, mas isso não se verificou. Esta centralização de serviços garantirá uma melhor alocação de recursos e consequentemente melhores resultados clínicos.
Tem faltado também ao longo dos últimos anos uma maior aproximação aos profissionais de saúde prestadores, ouvindo-os e integrando-os, fazendo com que estes sintam a reforma como deles, capacitando-os assim para fazerem parte da transformação.
Esta transformação não se dá se o sector da saúde for visto de uma forma estanque e apenas no sistema de saúde. Por isto, deverá ser ainda promovida a implementação de iniciativas intersectoriais. Escolas, segurança social, autarquias, ambiente deverão desenvolver atividades que promovam a saúde aos vários níveis, envolvendo vários profissionais com proximidade aos cidadãos e agindo de forma a beneficiar todas as partes envolvidas.
Hoje é essencial que se tenha uma visão mais ampla do sector da saúde e das reformas necessárias. É importante a chamada de todos os intervenientes da sociedade, desde o cidadão aos profissionais de saúde, professores, economistas, empresários, associações, governantes locais e governo central a desempenhar um papel de melhoria das condições de saúde.
Encontramos uma organização social pouco virada para estilos de vida saudáveis, com um crescente sedentarismo, excesso do uso de transportes motorizados e ausência de atividade física, consumo crescente de fast-food e fácil acesso a comida pouco saudável e a um fácil acesso a tabaco e álcool, principalmente na população mais jovem. O cidadão tem uma baixa literacia em saúde e a própria informação em saúde não é clara e objetiva. Com a crise agravou-se o aumento do desemprego, os cortes na saúde e com isto a vulnerabilidade social das minorias e as desigualdades sociais.
Desta forma é necessário agregar esforços para que seja possível uma coesão dos vários setores e dos próprios cidadãos, imprescindível para manter a esperança e sustentabilidade social. É importante criar e estabelecer uma cidadania responsável. Os cidadãos terão de compreender o seu papel e perceber que têm direitos, mas também deveres a cumprir para com a sociedade. A criação de redes de cuidadores informais (família, vizinhos, amigos) promoverá a coesão e inclusão e diminuirá as desigualdades.
As zonas urbanas terão de se transformar adaptando-se à promoção de uma vida mais saudável, criando parques desportivos, facilitando o acesso a comida saudável, criando iniciativas de literacia e promoção de saúde e usando as escolas como criadoras/promotoras destes hábitos.
Um consumo alimentar adequado e a consequente melhoria do estado nutricional dos cidadãos tem um impacto direto na prevenção e controlo das doenças mais prevalentes a nível nacional (cardiovasculares, oncológicas, diabetes, obesidade) mas também deve permitir, simultaneamente, o crescimento e a competitividade económica do país em outros setores como os ligados à agricultura, ambiente, turismo, emprego ou qualificação profissional.
Por tudo isto, é necessário que se aproveite o atual momento e vontade de reforma à Lei de Bases da Saúde para que se criem condições legislativas para toda esta reforma a implementar pelo bem do cidadão, pelo futuro da saúde em Portugal.
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Nota Importante:

No já aqui divulgado Jantar/Tertulia que o grupo dinamizador deste blogue promoveu para debater contributos para a Revisão da Lei de Bases na Saúde, estiveram presentes 27 participantes e convidados. Algumas das questões mencionadas neste texto foram abordadas, embora num espaço de tempo considerado curto para a complexidade do tema, mas apesar disso, que possibilitou a participação da Enfermagem no debate.
Como está em discussão publica até 19 deste mês (julho) o pré-projeto da proposta de lei, convidamos os leitores a enviar para a Comissão as suas propostas e, se assim o entender, a partilhá-las neste blogue.
Para tomarem conhecimento do pre-projecto de proposta de lei, aqui:
E para eventuais contributos, deverão ser enviados até às 23h59 do dia 19 de julho de 2018:
através de formulário, aqui:



20/06/18

Jantar/Tertúlia - Revisão da Lei de Bases da Saúde - 27 Junho



Considerando importante a reflexão e a discussão de temáticas relacionadas com a saúde,  decidimos promover a realização de um jantar tertúlia para debate sobre a revisão da Lei de Bases da Saúde, no próximo dia 27 de Junho às 19h 30m, no Restaurante "Valenciana", na Rua Marquês da Fronteira,157, Lisboa. 


Estão já confirmadas as participações do Dr. Cipriano Justo, da Drª Maria de Belém Roseira e da Drª Mariana Neto, aguardamos ainda outras confirmações.

Teríamos muito gosto em contar com a sua participação e contributos que poderiam enriquecer a discussão.

A inscrição deverá ser efectuada para o seguinte endereço electrónico : cidadanianaenfermagem@gmail.com, até ao próximo dia 23, indicando o nome completo e contacto telefónico.
O jantar terá o preço de 20€. Inscrições limitadas à capacidade da sala . 



Relatório Primavera 2018 - Meio Caminho Andado

O  Observatório Português dos Sistemas de Saúde apresentou hoje o Relatório Primavera 2018 . 
Consulte o documento aqui 

09/06/18

As doenças do SNS e seu tratamento (Artigo Opinião Enfermeira Maria Augusta de Sousa)

Artigo de opinião da Enfermeira Maria Augusta de Sousa publicado dia 7 de Junho no Jornal Público, Link 

"O SNS não tem um estatuto jurídico próprio que lhe permita não estar sujeito à permanente oscilação dos ciclos políticos.

Se, por um lado, assistimos a um grande unanimismo sobre a importância do Serviço Nacional de Saúde, por outro são preocupantes os diversos diagnósticos de doença do sistema de saúde. Que doenças são identificadas e quais as propostas de cura?

1. O quadro legislativo e o garrote que impõe ao SNS
A Lei de Bases da Saúde de 1990 introduziu uma alteração profunda colocando expressamente o sector privado em concorrência com o sector público quando na sua origem em 79 se colocava o sector privado e social em complementaridade onde o SNS não tivesse capacidade de resposta.
Nos quase 30 anos de vigência da lei, as políticas neoliberais conduziram a que o sector privado tenha hoje uma implementação em grandes unidades hospitalares à custa do definhamento dos serviços públicos, seja pelo subfinanciamento, seja pela captura de profissionais altamente qualificados sem os custos que lhe estão associados e à custa dos subsistemas de saúde, nomeadamente a ADSE.

2. A não existência de uma efetiva identidade do SNS
O SNS não tem um estatuto jurídico próprio que lhe permita não estar sujeito à permanente oscilação dos ciclos políticos, o que conduz à descontinuidade de orientações e políticas que deveriam estar plasmadas na Lei de Bases da Saúde mas que da atual se encontra ausente.

3. O subfinanciamento crónico do SNS
Não pode ser uma fatalidade, mas para tal são necessárias opções políticas que invertam a atual situação e que para além de ser necessário travar a diminuição do financiamento pelo OE, que atingiu cerca de um milhão de euros por ano entre 2010 e 2015 com o PSD e CDS a irem além da troika, esta situação provoca estrangulamentos nos recursos disponíveis – humanos e tecnológicos – cujas consequências para além do dia a dia nas respostas necessárias aos cidadãos, nos custos que estes e suas famílias suportam, e levam consigo reflexos que não são de imediato mas de médio e longo prazo na saúde global da população.

4. A ausência de planificação a médio e longo prazo no SNS e suas instituições tendo em conta as necessidades identificadas
Não existe uma planificação que permita identificar de forma objetiva as carências existentes a nível de pessoal e de tecnologias (equipamentos de vária ordem, muitos já obsoletos) que evite desperdícios e redundâncias, sendo muitas vezes decidido de acordo com os “lobbys” corporativos económicos e profissionais criando distorções na distribuição e na acessibilidade aos cuidados. Um efetivo observatório de saúde, seja a nível regional, seja a nível nacional, onde a Saúde Pública assume particular relevância está hoje praticamente desmantelado e de eficácia reduzida.

5. A predominância da “financiarização” sobre a autonomia e responsabilização da gestão
Tudo tem de passar pelas finanças mesmo quando se trata de cumprir os contratos celebrados por cada instituição com o Ministério da Saúde e das Finanças, o que promove uma cultura organizacional que impede, através da autonomia da sua gestão, a sua responsabilização no cumprimento dos compromissos e na agilidade das respostas necessárias.

6. A desvalorização dos profissionais e suas carreiras
A introdução de vínculos laborais diferentes, a estagnação na valorização do trabalho de todos os trabalhadores da saúde, a permanente desorganização dos horários de trabalho por carências efetivas são demonstrativas de ausência de uma politica de reconhecimento que o pilar essencial do SNS são os seus profissionais. Que estão exaustos, cansados e que se o privado lhe oferece melhores condições abandona o público, deixando este mais pobre e com menor capacidade de resposta.

7. A distribuição dos recursos sempre condicionada pela pressão do tratamento das doenças
Para além de serem sempre limitados e as necessidades ilimitadas, existe uma efetiva distorção na sua distribuição em função das necessidades identificadas. Os cuidados de proximidade, nomeadamente os CSP, CCI e os cuidados domiciliários, apesar de alguns avanços, é onde as lacunas de respostas mais se evidenciam, transportando para as urgências hospitalares as respostas com o consequente aumento de despesas e transtornos para os cidadãos.

8. As áreas de promoção e prevenção, incluindo a Saúde Mental, são os parentes pobres no SNS
Quando olhamos a distribuição do volume de financiamento do SNS e verificamos que apenas 0,3% são para cuidados domiciliários e 1,1% para cuidados preventivos, facilmente compreendemos como estas áreas têm pouca possibilidade de desenvolvimento das respostas adequadas que possam inverter a tendência “hospitalocêntrica” de um sistema cujo diagnóstico já está feito há muitos, muitos anos...

9. A ausência de intercomunicabilidade entre os vários níveis de cuidados
À situação anterior junta-se a questão da intercomunicabilidade e integração da prestação de cuidados. A organização por silos onde cada um pensa e gere de acordo com o seu umbigo cria entropias, despesismo e ausência de circuitos de facilitação para quem necessita de cuidados de saúde, ao invés de os circuitos estarem ao serviço das necessidades dos cidadãos.

10. As culturas profissionais determinam o funcionamento das organizações
A situação anterior não é alheia a culturas profissionais que procuram perpetuar a situação, havendo uma dominância da organização dos cuidados em função da organização médica desperdiçando competências de outros profissionais para respostas que deveriam, se centradas nos cidadãos, serem da responsabilidade de equipas multiprofissionais onde o profissional mais apto a dar resposta deve ser quem assume a intervenção, onde as repostas não têm todas de passar pela aprovação do médico mas por uma efetiva avaliação de resultados pelo que a equipa oferece para a melhoria da saúde dos cidadãos a que têm a responsabilidade de responder.

Em conclusão e o que fazer

1. Sobre o SNS, a sua defesa é a defesa da nossa saúde
Os serviços públicos são o garante do acesso de todos independentemente das condições económicas, religiosas, étnicas (universalidade) e a todos os cuidados de que necessitem na doença e/ou que integram a promoção, a prevenção, a reabilitação e a paliação.

2. O sector privado pode existir em complementaridade onde o SNS não tem resposta adequada
O sector privado não pode continuar a ser o que absorve parte do financiamento dos dinheiros públicos para a saúde, garantindo os seus lucros, definhando o sector público pela captação de recursos humanos altamente qualificados.
3. A planificação e a saúde em todas as políticas
Não podemos permitir continuar a navegar à vista e conduzir politicas que não sirvam a melhoria da saúde global dos cidadãos.

4. Investir e reconhecer o valor económico da saúde
É um imperativo e passa por investimentos tecnológicos urgentes e pelo efetivo reconhecimento dos profissionais com maior número, melhores salários e estes mais equitativos.

5. Um SNS que não seja formado por silos
Hoje há tecnologia de informação que permite repensar a organização dos cuidados que se oferecem. O caminho é que cada cidadão, de acordo com as suas necessidades, possa ter a resposta adequada e em tempo útil e não percorrer caminhos tortuosos no acesso aos mesmos.

6. Um SNS descentralizado e participado a todos os níveis
É necessário alterar a lógica da “financiarização” e da centralização por controlo de gastos, que só aumenta a despesa de curto e médio prazo. Por isso, a autonomia e consequente responsabilização da gestão deve ser garantida com a participação dos profissionais mas sobretudo com a participação dos cidadãos aos vários níveis de gestão do SNS.

7. Inversão na redistribuição dos recursos que contribua para diminuir as desigualdades
Criar as condições necessárias para um real investimento na promoção da saúde e prevenção da doença potenciando a utilização dos recursos comunitários existentes pela coordenação efetiva dos meios para as respostas às necessidades identificadas e minimizar as desigualdades existentes.

8. Culturas profissionais promotoras de respostas integradas
Os profissionais de saúde têm hoje formação e competências que não podem ser menosprezadas sem aliviar as suas responsabilidades nas escolhas do que é melhor para as respostas às necessidades dos cidadãos, capacitando-os e garantindo as respostas adequadas.

9. Capacitação dos cidadãos e participação efetiva 
A participação efetiva dos cidadãos, sem a qual as mudanças serão seguramente mais difíceis e mais pobres. Mas a participação efetiva exige capacitação e dinâmicas organizacionais distintas das que conhecemos até hoje.


Tomemos medidas antes que seja tarde."

31/05/18

Artigo de Opinião

A PROPÓSITO DO DIA MUNDIAL DA SAÚDE (7 DE ABRIL)

A. Têm boas razões os enfermeiros que se sentem lesados nas suas condições de trabalho. Não é caso único. Há muitos grupos profissionais a sentirem a mesma pressão no trabalho.

B. São essencialmente os mais jovens. Os mais velhos conhecem o rápido crescimento da profissão e da área de conhecimento respetiva. A história mostra que em poucas décadas houve uma evolução no sentido de desenvolvimento de competências e a respetiva autonomia para exercer a profissão. Mas o ambiente de cansaço e de lamentações, lideranças pouco eficazes, as pressões sociais e a cultura do imediatismo têm reflexos no exercício profissional no dia a dia.

De uma forma geral o desempenho profissional está num nível abaixo das qualificações profissionais dos enfermeiros. Mas há muitos exemplos nos serviços de saúde, ao nível da gestão e nas escolas, de enfermeiros que se sentem orgulhosos de ser enfermeiros e atentos à possibilidade de intervir como cidadãos de forma a melhorar a situação.

Na actalidade há janelas de oportunidade que não se podem perder. Ex: as políticas para a investigação são favoráveis aos estudos em enfermagem, ás possíveis alterações na carreira, ás alterações no sistema de ensino de enfermagem, entre outras.
C. Verifico que há enfermeiros que, para além das suas funções fazem questão de explicar áqueles com quem trabalham o que fazem e porquê, o que deviam fazer de acordo com as suas qualificações e com o saber que detêm, mostrando também o que resulta da investigação já existente sobre a eficácia do seu raciocínio clínico por força da análise de situações clinicas, levando em conta as diferenças individuais.

O processo do raciocínio clínico tem por base essa avaliação inicial que permite decidir intervenções terapêuticas, que por sua vez são avaliadas.

A investigação acompanha todas as etapas e transforma- se em orientações técnicas e guidelines.

A intencionalidade dos cuidados é claramente o máximo de bem estar, relacionado com as transições em que a pessoa se encontra. Do meu ponto de vista, este é um contributo individual ou de grupo muito importante. Ao contrário dos profissionais de saúde com que trabalhamos, as pessoas cuidadas expressam-se claramente.

D. É preciso que fique claro que a continuidade dos cuidados de saúde fica assegurada pelos cuidados de enfermagem.

Relativamente à profissão nos ultimos 10-15 anos, há a realçar:

- O conhecimento estruturado, mas sempre em aberto ao questionamento e validação;
- O grau de Doutor em Enfermagem, bem caracterizado;
- O nível de investigação reconhecido, com produção científica em percentagem maior do que noutras disciplinas na área das ciências da saúde;
- O reconhecimento a nível internacional – EANS
- A regulação profissional avançada, como suporte da prática profissional e com reconhecimento internacional.


28/03/2018 MARTA LIMA BASTO

21/05/18

António Arnaut deixa-nos! Mas …


… O  seu legado  permanecerá porque somos muitos a defendê-lo.

Sim, ao Homem que hoje deixou de estar entre nós queremos como cidadãos e enfermeiros afirmar que o seu exemplo de liberdade, verticalidade e lutador pela causa pública tem em nós a marca mais importante da democracia portuguesa – o SNS – que foi, é e será o pilar essencial para o acesso aos cuidados que todos os cidadãos têm direito.

É  no SNS que António Arnaut fundou que, quase quarenta anos depois,  todos os cidadãos  têm lugar pela sua universalidade e onde ninguém pode ficar à porta na concretização do seu direito à saúde.

Sempre levantou a sua voz na defesa intransigente do bem público que é a saúde e em consequência nos  momentos de tentativas de recuo por visões economicistas foi dos primeiros a denunciá-las apontando com clareza o seu significado para o agravamento das injustiças e desigualdade.

Também não podemos deixar de dizer o nosso obrigada pela sua permanente referência à importância do reconhecimento dos profissionais pelos saberes que colocamos ao serviço dos nossos concidadãos e do estímulo necessário para a sua dedicação.

Por tudo isto a melhor homenagem que este grupo de enfermeiros lhe quer fazer é continuarmos a ser obreiros na obra que ele começou.

Não abdicaremos de continuar a lutar para que o nosso SNS seja cada vez mais aquilo que na sua génese foi estruturado e que por isso é património de todos nós  .

15/03/18

24 MARÇO - ASSEMBLEIA GERAL DA ORDEM DOS ENFERMEIROS

 
 
Caros Colegas:

Vai realizar-se, no próximo dia 24 de Março pelas 11 horas, na Aula Magna da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro, a Assembleia Geral da Ordem dos Enfermeiros. Relembramos que a Assembleia Geral é o órgão deliberativo da Ordem dos Enfermeiros sendo decisiva a participação de todos no processo de construção da profissão.

Informamos que a Ordem dos enfermeiros disponibiliza transporte sujeito a prévia inscrição.

Para tal e:
  • se pertence à Secção Regional do Norte, deverá fazer a sua inscrição até dia 21 de Março, aqui
  • Se pertence à Secção Regional do Centro deverá fazer a sua inscrição até dia 19 de Março, aqui
  • Se pertence à Secção Regional do Sul deverá fazer a sua inscrição até dia 19 de Março, aqui

Não falte.

Exerça os seus direitos. Participe na construção do seu futuro.

O Futuro da profissão depende de todos.

13/03/18

VALORIZAR A ENFERMAGEM


VALORIZAR A ENFERMAGEM

(comunicação apresentada na Abertura do Encontro de Enfermeiros- Cidadania na Enfermagem a 3/03/2018 por Maria Augusta de Sousa)

Os tempos que socialmente estão a ser construídos são hoje atravessados pela velocidade da informação (e desinformação) que a Comunicação Social, a Internet e as redes sociais tornaram instrumentos centrais na vida de cada um de nós, não só como possibilidade de comunicação, mas também de desconstrução, pela facilidade de acesso e por vezes mesmo pela propaganda de menos rigor e verdade que, pela sua repetição, passa como realidade. A enfermagem e os enfermeiros não estão imunes a esta situação, pelo que importa clarificar algumas questões.
A enfermagem, pela sua natureza, tem uma responsabilidade social face aos desafios que se colocam à saúde dos cidadãos e à organização das respostas em cuidados de saúde, assim como às políticas que suportam as orientações e a disponibilização dos recursos necessários. Importa por isso que, como o maior grupo com número de alunos em formação no Ensino Superior na área da saúde e de profissionais no Sistema de Saúde, sejamos capazes de construir referenciais que nos permitam perspetivar a profissão a longo prazo.


Pensamos que devemos fazer um caminho que nos permita definir eixos estratégicos de desenvolvimento que perspetivem a profissão que desejamos a 10 anos. Não é tarefa fácil, mas é um exercício que só nós enfermeiros o devemos fazer para que outros não o façam por nós. Estou certa que seremos capazes, tal como colegas o fizeram nos anos 70 e que orientaram o caminho que percorremos nas décadas de 70/80/90.

Sabemos que as condições tanto na formação como no exercício profissional conheceram nas últimas décadas mudanças, mas que pela velocidade com que ocorreram, quase não demos conta:

- na educação, o ensino superior acentuou o sistema binário,  valorizando de forma distinta o ensino universitário e o ensino politécnico, não só com um crescimento no numero de alunos na área da saúde, mas também com o reforço de áreas de formação que se cruzam em saberes que deveriam ser partilhados para alicerçar novas formas de estar em saúde pelos vários profissionais. E consequentemente, na área da saúde passou a existir diferenciação das condições de acesso às diversas profissões.
- nas instituições de saúde, os modelos de gestão assentam cada vez mais numa lógica de produtividade por atos/programas e ciclos[ que o cidadão percorre (mais em função da organização dos profissionais do que de acordo com as suas necessidades) que ocultam os contributos que cada um dá na cadeia da oferta de cuidados. É disto exemplo a forma como são organizados determinados dados estatísticos, em que os enfermeiros nem aparecem.
INE/INSA 2014 – inquérito nacional de saúde divulgado em 2016


Sabemos que as alterações demográficas e epidemiológicas são hoje distintas dos anos ainda próximos, ou seja a esperança de vida aumentou mas os anos de vida saudável não mudaram muito. Com estas mudanças temos um índice de envelhecimento que em 10 anos passou de 111,5 (2006) para 150,9 (2016) e uma população idosa portadora de comorbilidades e com dificuldades crescentes no que respeita a Atividades de Vida Diária.






Sabemos nós enfermeiros que esta realidade implica cuidados de suporte que contribuam para uma vivência das transições ao longo do ciclo vital que garanta as melhores condições para a vivência dos seus processos de saúde/doença. Os enfermeiros são os profissionais que podem ser a referência essencial para a continuidade e segurança dos cuidados.
Contudo, continuamos numa lógica de organização dos cuidados suportada na organização dos cuidados médicos e esta situação não tem permitido a apropriação dos instrumentos que a profissão tem para que as suas intervenções autónomas e interdependentes tenham expressão visível na cadeia de cuidados. Consequentemente, os enfermeiros não têm feito parte de uma lógica de investimento, mas sim de despesa.
Esta ausência de apropriação conduz a que na “guerra” dos territórios profissionais, (hoje mais diversificada porque existem mais profissões) não seja valorizado por outros (e por muitos de nós) um verdadeiro trabalho de equipa multiprofissional e interdisciplinar, onde a centralidade e a reposta às necessidades a quem dispensamos cuidados deve ser, não o somatório do que cada um faz, mas sim o que cada um transporta como valor acrescentado.
O ensino das várias disciplinas da área da saúde continua espartilhado, cada um nos seus saberes, quando poderia ser um importante instrumento de mudança de culturas profissionais fechadas em si mesmas. Novas estratégias para o ensino e investigação em saúde são desafios que se colocam e que exigem trilhar caminhos de concertação.
Sabemos que a evolução científica e tecnológica permitem novas respostas que contribuam para a melhoria do estado de saúde e bem-estar dos cidadãos, contudo continuamos a ter uma realidade dos recursos disponíveis para os quais não se vê a assunção de um planeamento estratégico, à semelhança do que se está a realizar com o SNS de Inglaterra, que está a realizar um trabalho para a definição das necessidades da força de trabalho até 2027.
Se voltarmos a analisar o slide 1 – Recursos Humanos no SNS, verifica-se que no ensino o numero de alunos de medicina se aproxima do numero de alunos de enfermagem e que no que respeita aos RH na saúde a estabilidade de crescimento foi apenas no grupo médico, estando o grupo de assistentes operacionais desfalcado o que significa limitações à organização de cuidados, mas também no que aos enfermeiros diz respeito, a não assunção das suas áreas de responsabilidade, onde a delegação de tarefas é, por vezes, não assumida.
Contudo os Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável apontam metas para o ano 2030 onde a saúde universal é uma meta e a OMS defende que “Enfermeiras e Parteiras: são a chave para a saúde universal”. Também por isto devemos construir uma visão de longo prazo e sermos intervenientes nas mudanças.


É no aprofundamento deste quadro e dos espaços onde os enfermeiros intervêm, no ensino, na investigação, na prestação de cuidados, na gestão e na assessoria que acreditamos ser possível fazer um caminho que nos permita definir eixos estratégicos de desenvolvimento que perspetivem a profissão que desejamos a 10 anos.
Se olharmos o nosso percurso como profissão nas quatro últimas décadas, os pilares do seu desenvolvimento foram sempre a formação/autorregulação profissional/ regulação laboral/carreira, o que nos dá um grande estímulo para continuarmos a lutar pela valorização da Enfermagem.  
Neste espaço hoje criado, optamos pela discussão destas temáticas pela pertinência e atualidade de que se revestem, e por isso poderem tornar-se numa alavanca para respondermos a desafios futuros.
Seguramente surgirão muitas questões neste Encontro, mas também vontade de continuar e para a qual contamos com os vossos contributos.

05/03/18

SÍNTESE DO ENCONTRO DE ENFERMEIROS - CIDADANIA NA ENFERMAGEM - 3 MARÇO

ENCONTRO DE ENFERMEIROS - CIDADANIA NA ENFERMAGEM

Auditório Hospital D. Estefânia  3/03/2018

SÍNTESE :

Das 176 inscrições para o encontro estiveram presentes da parte da manhã na sala 101 pessoas  e da parte da tarde 118, tendo sido recebidas algumas mensagens de inscritos justificando ausências por motivos inesperados/familiares ou em consequência da intempérie, como por exemplo o caso dos enfermeiros da Madeira.  

O programa foi totalmente cumprido, num ambiente sereno que permitiu o questionamento aos vários elementos das mesas dentro dos períodos de tempo disponibilizados, sendo reconhecido por alguns dos presentes a mais-valia da informação recebida e das hipóteses futuras para o seu aprofundamento noutras iniciativas a promover pelo grupo dinamizador do blogue Cidadania na Enfermagem.

Na Abertura, (embora essa informação esteja presente no blogue) este grupo de enfermeiros foi novamente identificado, explicadas as razões para a sua existência e divulgadas e justificadas as áreas que considera prioritárias para debate, solicitando aos presentes que divulguem a possibilidade de intervenção agora criada, contribuindo com comentários e sugestões nesse espaço on line. O blogue é um meio para isso, uma possibilidade de construção de pensamento crítico importantíssimo para a Enfermagem nos tempos que correm. Das áreas selecionadas, o grupo dinamizador quis promover o debate em torno a duas que considerou mais prioritárias dentre as selecionadas (Ensino/Desenvolvimento Profissional) e que estão relacionadas entre si.

Foi salientada a necessidade da profissão ser mais compreendida e valorizada, numa época em que as novas políticas, as novas orientações e os contextos onde se trabalha sofrerem variadas influências que podem ter repercussões negativas para os enfermeiros,  se estes não se fizerem ouvir de forma mais sistematizada, fundamentada e científica.

Há que desocultar a Enfermagem a nível da sociedade, das organizações, das estatísticas de saúde (onde os enfermeiros não aparecem) e da forma de trabalhar não partilhada com os outros profissionais desta área. Foi reconhecida a tendência actual para outros ocuparem o lugar na equipa de saúde que por direito era nosso, havendo que reforçar a complementaridade do papel dos enfermeiros na prestação de cuidados.

As actuais situações de saúde complexas na nossa sociedade implicam também evidenciar o contributo da enfermagem vocacionado para os ganhos em saúde, por exemplo perspectivando-o a 10 anos, ao mesmo tempo promovendo o seu próprio desenvolvimento profissional, tal como outras iniciativas internacionais já o estão a fazer.

A mesa Ensino/Formação reforçou alguns constrangimentos existentes e lançou algumas questões importantes que merecem ser discutidas e aprofundadas, numa tentativa de se contornarem ou superarem os obstáculos existentes.


Embora o Ensino da Enfermagem seja actualmente de nível superior no subsistema politécnico, continuamos com um sistema binário muito vincado, tendo-se perdido em 2007 a hipótese de, à semelhança da maioria das profissões da área da saúde, ter conquistado o mestrado integrado, com consequências negativas também na valorização salarial dos enfermeiros, o que muito os revolta.

As propostas da OCDE, há muito pouco tempo divulgadas, permitem que, quanto à atribuição do grau de Doutor e na investigação, o Ensino Politécnico se possa aproximar do Ensino Universitário embora de forma muito controlada, parecendo haver vontade política e europeia para uma certa “uniformização” que não resolverá de todo as diferenças existentes pelo menos a curto prazo, no entendimento de alguns dos presentes.

A enfermagem enquanto disciplina e profissão só se poderá afirmar e desenvolver com base na investigação, apresentando dados que permitam solidificar e consolidar o conhecimento e sobretudo permitindo o uso dos dados obtidos na melhoria das práticas. Tem que se dar algum tempo para se reflectir sobre  quais as prioridades da investigação e fazer sentir a todos com que lidamos a necessidade de terem  enfermeiros a seu lado.

Outras questões prementes na actual situação do Ensino foram remetidas, a pedido de muitos presentes, para outros fora (tal como debater/analisar  consequências de qual dos subsistemas deverá ministrar o ensino da enfermagem,  de como pensar a formação especializada, a articulação ensino/exercício e prever a hipótese do aparecimento da formação de auxiliares de enfermagem).

Foi solicitado a este grupo que continuasse a promover o debate e divulgasse informação sobre o tema de forma mais abrangente, pois reconheceu-se a existência de alguma iliteracia em enfermagem a este respeito.

Ficou patente que, dados os contextos onde os enfermeiros exercem e as pressões sociais a que todos estamos sujeitos,  não existe muito tempo para consulta de documentação, para reflexão e sobretudo para discussão aprofundada, pelo que estes fora são muito úteis para redirecionar as atenções para o que é importante,  e evitar um certo distanciamento e alheamento favorável a que poucos decidam o futuro profissional de muitos.


Na mesa Desenvolvimento Profissional e Carreira participaram representantes do SEP, SE e o Presidente da APEGEL. Faltou a voz do órgão regulador, embora tivesse sido convidado, numa altura em que ele preconiza diversas alterações regulamentares ainda muito pouco debatidas e conhecidas.


Uma carreira reflete o desenvolvimento profissional, embora possa significar coisas diferentes consoante se trabalhe em instituições publicas (também com diferentes vínculos) e em organizações privadas...São muitos os constrangimentos legislativos e conjunturais que dificultam a estruturação do desenvolvimento profissional baseado apenas em carreiras. O tipo de gestão que está instituído não se compadece com desejos e aspirações legítimas, sendo urgente que os enfermeiros se organizem de forma a discutir um plano estratégico que valorize a enfermagem, reflita sobre a sua própria organização de trabalho e evidencie o seu valor na equipa de saúde.

É muito importante que  a reestruturação da carreira deva ser adaptável às mudanças estruturais no modelo de desenvolvimento profissional dos Enfermeiros.

De acordo com a APEGEL os pilares fundamentais para o desenvolvimento profissional estão directamente relacionados com a regulação da profissão e implicam assegurar a segurança na prestação de cuidados (baseada em dotações seguras, conhecimentos seguros, práticas seguras e organizações seguras), em definir áreas de exercício, em reconhecer competências e em reforçar a liderança. Estes aspectos deverão estar na base da construção de carreiras, aspectos que  vão muito para além de simples questões remuneratórias... Defende que a carreira terá de traduzir claramente as competências especializadas e as dotações seguras, terá de realçar o importante papel dos Enfermeiros na vigilância da saúde das pessoas e das populações e que terá de assegurar o desenvolvimento profissional dos Enfermeiros.

As duas estruturas sindicais presentes apresentaram os seus pontos de vista para o desenvolvimento de carreira, verificando-se alguma divergência na fundamentação das suas propostas. Uma proposta (SEP) tem em conta os constrangimentos legislativos existentes, outra prefere contorná-los através da persistência e convicção histórica das suas razões (SE).

No debate gerado ao longo do dia, foram colocadas algumas questões aos elementos das Mesas, as quais se relacionaram com: competências com que os jovens Enfermeiros concluíram a licenciatura e se no mercado de trabalho para iniciarem o exercício profissional encontram possibilidade de as aperfeiçoarem; com as condições dos contextos da prática clínica para serem utilizadas como unidades para estágios; com a necessidade de se proporcionarem condições para que os docentes e os Enfermeiros da área clínica possam circular entre as duas áreas de trabalho em intercomunicabilidade reciproca; as condições que atualmente os Enfermeiros Gestores (das categorias subsistentes) possuem para o exercício da gestão; e com os requisitos, condições e métodos mais pertinentes para selecionar os Enfermeiros mais aptos e mais capazes para os postos de chefia e direção (em futura carreira).

Quer durante o debate do tema da manhã, quer no tema da parte da tarde, os participantes evidenciaram que houve uma regressão na Enfermagem em Portugal, pois continuamos em circulo, discutindo problemas que já haviam sido contornados, mas que voltaram, quando se pretendia que já estivéssemos numa linha reta em direção ao futuro (alguns dos participantes deram a conhecer situações de desempenho que os revolta e desencanta).

Deve-se apostar mais no debate de critérios para o desenvolvimento profissional em função das qualificações dos enfermeiros e do seu contributo e mais valia na equipa de saude, promovendo, ao mesmo tempo, a sua autonomia.
Foi também sugerido que a enfermagem se faça representar em fora de outras profissões da área da saúde, de modo a fazer ouvir a sua voz, saindo do seu restrito âmbito profissional e reafirmando o seu exercício de cidadania.

Em 2018, ano de diversas efemérides para a Enfermagem Portuguesa (que demonstram o seu crescimento enquanto profissão) e que foram lembradas na abertura, o grupo dinamizador do blogue Cidadania na Enfermagem  sentiu-se apoiado pelos participantes para prosseguir com iniciativas que promovam o debate de ideias e possam aportar contributos para a efectiva valorização da enfermagem.


A pedido dos participantes, no blogue iremos disponibilizar toda a informação que conseguirmos obter, contribuindo para um maior esclarecimento de todos os que o consultarem, nomeadamente, fornecendo os textos que estiveram na base deste Encontro.

Muito obrigado a todos os presentes, saímos todos a ganhar!